Um impasse que já dura mais de um ano entre o Supremo Tribunal Federal (STF) 
e o Tribunal Superior do Trabalho (TST) levou à paralisação, no começo de março, 
de milhares de processos trabalhistas que tratam da "responsabilidade solidária" 
da administração pública em relação aos direitos de funcionários de empresas 
terceirizadas. Por esse critério, se a empresa privada não pagar seu empregado, 
o órgão público que a contratou é o responsável.
Só no TST, tramitam 10 mil processos sobre o tema. Todos estão com o 
julgamento suspenso. Segundo magistrados, milhares de ações em andamento nos 
demais tribunais trabalhistas também foram prejudicados.
O imbróglio - entenda no quadro abaixo - começou no fim de 2010, quando o 
Supremo questionou a aplicação de uma súmula do TST que estabelecia a 
responsabilidade solidária do poder público nos casos de terceirização. Desde 
então, o TST alterou o texto da súmula, mas ministros do Supremo continuaram a 
questionar seu teor. As súmulas do TST abordam detalhamento de direitos 
trabalhistas que não estão previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). 
Elas não são vinculantes, ou seja, a aplicação não é obrigatória para outras 
instâncias da justiça trabalhista. No entanto, as súmulas servem de base para a 
decisão dos magistrados trabalhistas em todo o país.
Suspensão
Para evitar que, devido ao impasse, o Supremo 
anulasse decisões tomadas, o TST determinou, no último dia 8, a suspensão da 
análise de todos os recursos sobre terceirização no setor público até uma 
palavra final do STF sobre o tema.
A decisão do Supremo está nas mãos da ministra Rosa Weber, a mais nova no 
tribunal e oriunda da área trabalhista - ela foi ministra do TST antes de ser 
nomeada pela presidente Dilma Rousseff para o Supremo.
Não há previsão para que a ministra decida sobre o caso. O resultado valerá 
para todos os recursos que chegarem ao Supremo sobre o assunto e definirá a 
diretriz que o TST dará para todos os processos sobre o tema na Justiça do 
trabalho.
A Advocacia-Geral da União (AGU), autora do recurso no Supremo, argumenta que 
a Lei de Licitações proíbe que a administração pública seja condenada nesses 
casos.
Para o diretor de Assuntos Legislativos da Associação Nacional dos 
Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Germano Siqueira, a aplicação da 
súmula 331 deve ser preservada.
"Não colocar o dedo na ferida [...] é prolongar um regime de derivação, de 
uma outra face da impunidade, que responde por essa relação promíscua que passa 
pelas licitações de serviços e agora se pretende colocar a conta do prejuízo na 
mão do mais fraco", diz o magistrado, referindo-se ao trabalhador 
terceirizado.
Ele afirma, porém, que o fato de o caso estar com a ministra Rosa Weber é um 
alento para quem defende a "celeridade" da análise do processo por conta da 
"afinidade que tem a relatora com o tema".
A Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) diz que, em algumas 
varas, processos sobre terceirização representam até 70% da atuação do 
magistrado responsável. Ele é a favor da continuidade da responsabilidade 
solidária.
"Ninguém advoga que o dinheiro público deva ser usado de maneira inadequada. 
Mas nesse caso a administração pública deve responder, sim, de forma solidária. 
O que se vê hoje é que as empresas privadas, sabendo que podem vir a comparecer 
para pagar os direitos trabalhistas, têm tomado cautela ao contratar empresas 
terceirizadas. Ao passo que o setor público não está fazendo o dever de 
casa."
A juíza Erotilde Ribeiro dos Santos Minharro, do Tribunal Regional do 
Trabalho de São Paulo (TRT-SP), afirma que a paralisação dos processos é uma 
medida de "cautela".
"É melhor parar tudo, esperar o julgamento desse recurso, para saber 
efetivamente qual vai ser o entendimento e depois julgar. [...] Se eu julgar 
contrariamente ao STF, vai atrasar mais ainda. Se eu teimar, vai ser tudo 
anulado para que se julgue conforme o Supremo. Haveria maior desgaste e uma 
expectativa da parte que vai ser frustrada. É uma questão de cautela", diz a 
juíza.
A magistrada afirma que, caso o Supremo derrube a responsabilidade solidária, 
pode haver um prejuízo grande para o trabalhador. "Isso é preocupante porque a 
maior parte das relações trabalhistas acaba na terceirização e ela está no dia a 
dia. Em boa parte dos processos, não haverá ninguém para pagar."
Congresso
Especialista em direito trabalhista do 
Instituto de Advogados de São Paulo (Iasp), João Armando Moretto Amarante 
defende uma nova lei sobre terceirização, embora critique a demora dos 
parlamentares em analisar projetos sobre direitos do trabalhador.
"Deveria existir uma lei. A súmula não tem força de lei, mas os tribunais 
estão tendo um papel muito importante até por conta da inércia do Congresso. O 
que o STF vai fazer é uma interpretação razoável da lei, porque a jurisprudência 
é clara. Se depender do Congresso Nacional, a situação não vai ser 
resolvida."
Na Câmara, está em discussão "adiantada" uma nova legislação sobre o trabalho 
terceirizado, segundo parlamentares ouvidos pelo G1.
O projeto de lei 4330/2004, de autoria do deputado Sandro Mabel (PMDB-GO), 
foi discutido durante todo o ano passado em uma comissão especial formada por 
deputados - inclusive com representantes das centrais sindicais e dos sindicatos 
patronais.
Em novembro, um parecer foi aprovado na comissão especial, e o projeto agora 
tramita em caráter conclusivo (sem necessidade de passar em plenário) na 
Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa. Se aprovado, será encaminhado 
diretamente para o Senado e depois vai à sanção presidencial.
O projeto cria a figura da empresa especializada, proibindo prestação de 
serviços por parte de empresas que realizam serviços de áreas distintas.
O ponto polêmico é o que abre possibilidade para contratação de terceirizados 
em quaisquer áreas das empresas, e não mais somente da "atividade meio" como 
acontece atualmente. Por exemplo, uma empresa de engenharia não pode contratar 
um engenheiro terceirizado, mas o serviço de limpeza pode ser feito por um 
prestador de serviço.
De acordo com o deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da 
Força, que partipou das negociações a respeito do projeto, há maioria para 
aprovação do projeto como está, mas ainda há discussão com parte do movimento 
sindical que rejeita a proposta. Dirigente da Força Sindical, ele se diz 
favorável à proposta.
Presidente da Comissão de Trabalho e de Administração e Serviço Público da 
Câmara, o deputado Sebastião Bala Rocha (PDT-AP) afirma crer na aprovação dessa 
regulamentação do trabalho terceirizado, considerado "interessante" por ele.
"O projeto foi votado na comissão especial em um entendimento, em consenso 
entre as centrais e o setor patronal. Agora, essa decisão do Supremo sobre a 
terceirização vai forçar que a CCJ acelere a votação", afirmou.
As associações de magistrados rejeitam o projeto de autoria de Sandro Mabel. 
Para as entidades, a proposta pode levar à "precarização ainda maior" do 
trabalho terceirizado.